29/07/2008

MATUTO NA CAPITÁ
Jovino Fernandes
Pronto, está decidido. Vamos viajar. O matuto recebe o convite e diz: vou topar o desafio e descobrir que tenho coragem de fazer esta viaje pra notar o que esta capitá tem para me dá. Pensei! Tudo muito simples: É só entrar na marinete, dormir e logo mais estarei lá, longe dos políticos repugnados, dos farsos amigos, das fofocas, não gosto nem de imaginá. Fugindo de tudo isso, já estou imaginando no vexame que vou ter que pagar.
Capitá é coisa de gente sivilizado. Matuto tem que se lascar. Tem que viajar de metrou pra economizar, sem falar nos asartos que tem que enfrentar. Arre égua, assim não dá. Será que não vão me açaltar?
Valeime meu padrinho padre cilso, deixei minha espingarda e meus apetrechos de cortar. Aonde fui parar? Com medo dos asartos, cuidei logo de me guardar. Caminhar, passear em shopis, Deus me livre, vou tumar minha celvejinha e me deitar.
Depois de muita insistença pra sair, aceitei. E agora? O que eu faço? Fiz tudo como manda o figurino. Agora é só começar a seguir as orientação pra não brigar. Braço no meu ombro que eu vou te guiar. As ordens tenho que acatar. Vamos caminhar. Sai da frente minha gente, estou com um cego que não sabe andar. E lá vou eu.

Ah, quase que esqueço. Pra passar como cego elegante tenho que aprender a carçar sapato novo que o velho já não dá pra usar, as aprecatas tá feia tem que renovar, vestir carça curta parecido como político pra ficar iguá, tenho que saber comer, conversar, usar o portugueis correto (tu viss, tu vai, tu já comeu, ), pra não decepcionar.

Por falar em comer, há muito tempo que não como nada. Imagine um tabaréu em um restaurante granfino na capitá quando alguém pergunta, tu já comeste frutos do mar? Aí, é de arrepiar! Na minha terra não tem onde pescar.

Eu só como bode, galinha de granja, fato, buchada, tripa e, às vezes vatapá. Coisa de pobre. Comida boa é cara, o que é que fui fazer lá?

Outra coisa que me alembrei, na capitá, oiar pras muier nem a vista pode levantar, muito menos falar. Eita cidade complicada, porque será?

Ai, eu fiquei a imaginar. Será que na capitá não tem borracheiro pra concertar?
Ei. Pára tudo. Onde está o prazer? Não dizem que a gente tem que fazer o que gosta? Ah. Só depois da gente aprender é que a gente faz o que gosta? Mas já aprendi a falar: tu viss, tu vai, tu gosta, o que falta ainda?

Meu professor durante a aula dizia que tem que ter sacrifício? Sacrifício! Mas que sacrifício é este que não acaba?

Agora eu entendo. Por falar em fazer o que gosta, lembrei da minha professora. Professor (a) honesto passa por cada uma. O que é que eu fui fazer lá? Não sou político, não uso vale refeição, não sou prefeito, vereador, não uso cartão corporativo. Ah, professora, bem que a senhora me disse, pra um tabaréu ou professor, fazer tudo isto numa capitá somente, uma coisa pode se explicar: “paixão”.