27/04/2010

Águas de março agitam a Nau da Igreja!

Texto: Francisco Assis Melo
Uma ocasião li uma entrevista do falecido deputado Ulisses Guimarães, na qual afirmou: “...às vezes precisamos ficar observando as ondas do mar rebentando-se contra as rochas, e de suas espumas tirarmos conclusões”. Pois bem. É isto que tenho feito desde que começou a onda de denúncias contra padres católicos, por abusos de menores, e que tiveram seu ápice em março passado e continuam no presente.

Desde o princípio ficou claro o objetivo de muitos de atingirem a pessoa do Papa. Acusações improcedentes de omissão diante de um caso ocorrido em Munique, quando foi seu Arcebispo e de outros ocorridos quando ocupava o cargo de prefeito da Congregação Para a Doutrina da Fé, insanas ameaças de pedido de sua prisão durante a visita que fará ao Reino Unido, dentre outros, revelam a utilização dessas denúncias como forma de desacreditar o Papado e desmoralizar a Igreja.

Não se trata aqui de por em dúvida as denúncias apresentadas contra clérigos. Evidente que são verdadeiras e o próprio Papa as reconhece e humildemente apresentou seu pedido de desculpas, pelo desvio de alguns trabalhadores da vinha do Senhor. Entristece a todos nós católicos pelas conseqüências ruins na vida de muitas das vítimas, e também pelos que faltaram com a fidelidade a Jesus e à Sua Igreja.

Mas não se pode ficar impassível diante da injusta acusação de omissão do Santo Padre diante dos abusos denunciados, seja como Arcebispo e Cardeal Ratzinger, seja como Papa Bento XVI, assim como da tentativa de imputar-se ao clero como um todo a mancha de alguns poucos padres.

Reconhecido por sua intelectualidade e crítico da cultura moderna fundamentada no Iluminismo e seus conceitos relativistas, já na Missa Inaugural do Conclave em que foi eleito lamentou pelos que se deixam conduzir “ao sabor de vento de qualquer doutrina como atitude à altura dos tempos atuais”, afastando-se da fé verdadeira segundo o credo da Igreja instituindo, assim, uma “ditadura do relativismo” onde nada é definitivo e privilegia o “eu” e suas” vontades.

Pouco antes, durante a celebração da Via Sacra no Coliseu de Roma, que presidiu, assim comentou a terceira queda de Jesus, sob o peso da cruz: "Mas não deveríamos pensar também em tudo quanto Cristo tem sofrido na sua própria Igreja? Quantas vezes se abusa do Santíssimo Sacramento, da sua presença, freqüentemente como está vazio e mau o coração onde Ele entra! Tantas vezes celebramos apenas nós próprios, sem nos darmos conta sequer da presença d'Ele! Quantas vezes se contorce e abusa da sua Palavra! Quão pouca fé existe em tantas teorias, quantas palavras vazias! Quanta sujeira há na Igreja, e precisamente entre aqueles que, no sacerdócio, deveriam pertencer completamente a Ele! Quanta soberba, quanta auto-suficiência! Respeitamos tão pouco o sacramento da reconciliação, onde Ele está à nossa espera para nos levantar das nossas quedas! Tudo isto está presente na sua Paixão".

Ao assumir a Cátedra de Pedro destacou dois deveres essenciais de seu pontificado: dar testemunho de Cristo no mundo paganizado, repetindo incansavelmente “Jesus Cristo é o Senhor” ante os pretensos deuses do mundo, afirmando a unicidade da Igreja no plano divino de salvação; e a defesa da inviolabilidade da vida humana, desde a concepção até a morte.

Suas atitudes firmes e corajosas na condução da Nau da Igreja, em suas próprias palavras na homilia da Missa Inaugural do Conclave “muitas vezes agitada por ondas, lançada de um extremo ao outro: do marxismo ao liberalismo, até ao ponto de chegar à libertinagem; do coletivismo ao individualismo radical; do ateísmo a um vago misticismo religioso; do agnosticismo ao sincretismo, e por aí adiante", e sua defesa intransigente da vida humana, têm-lhe rendido antipatias e inimigos, que não são seus, particularmente, menos ainda e somente da Igreja Católica e sim de todo o mundo cristão que igualmente defende a única Verdade, que é Jesus, e se opõe às teses iluministas do mundo secularizado.

Com muita propriedade o Senador Italiano Marcello Pera, acadêmico e pensador liberal, não católico, o que atribui maior importância às suas declarações, assim se manifesta ao Corriere de La serra e publicado em seu próprio blog: “O Papa é o alvo imediato das denúncias de escândalos global do abuso sexual de crianças dentro da Igreja. Mas o alvo principal é o cristianismo”. E continua: “há uma guerra entre o cristianismo e uma ideologia laicista, (secularizada e iluminista - grifo nosso), amplamente difundida na Europa e grande parte do Ocidente, que considera a religião como um obstáculo para a liberdade do indivíduo”.

Como liberdade para o indivíduo entenda-se a prática do aborto, a questão relativa à manipulação cientifica de embriões humanos, o uso de preservativos como forma de liberação sexual em contraponto ao mandamento da castidade, a eutanásia, casamento entre pessoas do mesmo sexo, etc...

Ora, a breve leitura do texto acima não exige muito para concluir a que “sujeira” na Igreja e a que “sacerdotes deveriam pertencer somente a Ele” o Cardeal Ratzinger se referia em sua reflexão no Coliseu, durante a Via Sacra. Evidente que se referia, principalmente, a tudo o que assistimos hoje em termos de denúncias contra padres católicos.

E também a muitos que, de forma inconsciente ou não, navegam na Nau de Pedro acenando para embarcações que têm bandeiras contrárias à sagrada doutrina.

Logo, acusar de omissão quem teve a coragem de, às portas de um Conclave, proferir discursos tão duros alertando para uma crise na Igreja, é gritante injustiça. E é essa coragem de Bento XVI que tem incomodado a muitos que pretendem uma Nova Ordem Mundial sem religiões, fundamentada no iluminismo, que têm nele e na Igreja Católica seus principais empecilhos e, portanto, precisam ser desacreditados.

Esquecem-se, contudo, que a Igreja é uma instituição divina, fundada por Jesus, edificada sobre a rocha que é Pedro e continuada até a consumação dos séculos pelos seus sucessores. E as trevas não prevalecerão contra ela.

(Próximo artigo: Pedofilia e Igreja)