12/03/2015

Coluna A Tarde: Ao Deus dará

Fonte: bahianoticias / por Samuel Celestino
Dilma Rousseff está entre a cruz e a caldeirinha. Ou, se quiserem entre a cruz e a espada. Atravessa, levando o Brasil com ela, dificuldades até pouco tempo inimagináveis, oriundas do seu primeiro mandato. De temperamento difícil, jamais reconheceu como resultado de um comando para o qual ela não estava preparada para exercitar. Surgiu de um projeto político concebido por Lula que teria, depois do mandato da sua cria, continuidade com ele, num retorno ao Planalto. Era o projeto de 20 anos no poder, do qual José Dirceu, então chefe da Casa Civil, foi partícipe. A presidente começou a errar ao organizar uma equipe ministerial de governo incompetente, à frente o fraquíssimo ministro da Fazenda Guido Mantega, senhor de todas as mentiras.

A presidente está hoje isolada. Não no Palácio do Planalto, mas no castelo que sonhou. Para Lula, Dilma era perfeita para conduzir o projeto do PT. Sequer pensou em outro nome. Seria ela, até porque jamais fora política e suas ambições não seriam maiores do que a estatura do criador, ele próprio. O PT, fundado lá no início dos anos 80 pelo então metalúrgico alicerçado pelas Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica (Frei Beto à frente) e por intelectuais de formação diversificadas. O partido sofreu desde a sua fundação uma metamorfose que acabou por afastar grande parte da igreja e dos intelectuais que divergiram das mudanças ocorridas no partido. Desapareceram quase em massa após o mensalão e outras tramóias engendradas no alto escalão da legenda.

O isolamento de Dilma fica claro a partir da sua reeleição quando o País tomou conhecimento de que a sua pregação eleitoral estava muito distante da realidade. Explodiu com a corrupção generalizada através de segmentos que transformaram a Petrobras em massa de manobra para propinas e tudo o mais que o Brasil, em choque, tomou conhecimento. A partir de dezembro último, mas, especialmente, no primeiro mês do segundo mandato, a economia brasileira deu sinais evidentes de que o País estava, como está, à beira de um colapso econômico que atingirá a sua população de maneira geral, com peso maior nas classes menos favorecidas.

Isolada na sua torre do castelo sonhado, Rousseff ficou sem contatos, porque com o escândalo da Petrobras o sistema político congressual foi levado também à breca, com as descobertas da Operação Lava Jato que deu conhecimento da absoluta falta de ética dos principais setores da República, a começar pelos políticos, PT à frente, que idealizaram a roubalheira, tomando como exemplo o que foi idealizado pelo mensalão, lá em 2003, no início do primeiro governo de Lula. Tornou-se maior, muito maior, espraiou-se pelas estatais (algumas ainda virão à tona) e como instrumento de saques das empreiteiras beneficiadas por contratos superfaturados. Abriu-se, então, a torneira para a distribuição de propinas, partidos e políticos na dianteira.

Como cabra-cega, Dilma já não sabe para onde vai. No domingo último, dia Internacional da Mulher, ela, em rede nacional de televisão, abusou de um discurso extenso, cansativo, com poucas verdades, responsabilizando o que está a ocorrer como resultado da crise econômica internacional. Esta crise já está ultrapassada, a não ser em poucos países como Portugal, Espanha e, principalmente, a Grécia. O discurso demonstrou também o seu isolamento. É inadmissível que, dentre os seus assessores, não houvesse quem a aconselhasse. Primeiro, sugerindo-a diminuir o texto cansativo, massacrante, desrespeitoso por não conter verdades e que acabou gerando vaias e manifestações na mesma noite de domingo em diversas capitais do País.

As consequências daqui para frente tendem, supõe-se, a piorar. As vaias serão suas companheiras quando surgir em público, como ocorreu em São Paulo. O futuro da presidente, embora o impeachment seja um absurdo inaceitável, passa a ser uma interrogação. Onde vai parar? Até que ponto o Planalto ainda acha que a população continuará sendo engabelada? De que maneira será possível o Brasil sair da situação em que está mergulhado com a economia rodopiando ladeira abaixo, e o mundo inteiro voltado para o que poderá acontecer num País que, ainda outro dia, estava na condição de emergente, na posição de sétima economia mundial. É em São Paulo, coração industrial do gigante, onde está o principal  foco de reação a ela e ao PT.

São tantas, são muitas perguntas, principalmente sobre o que acontecerá também como o Congresso, cujos presidentes das duas casas, Senado e Câmara, estão mergulhados na relação dos possíveis envolvidos na corrupção. Como fazer para reorganizar os entes federativos, os estados com seus municípios, que certamente atravessarão imensas dificuldades. A verdade é que não se pode mentir diante de tamanhas dificuldades. A verdade sempre emerge e o prejuízo maior será para quem mente.

*Coluna publicada originalmenre na edição desta quinta-feira (12) do jornal A Tarde