Políticos de Paulo Afonso já foram premiados por
instituto que elegeu jumento como “Prefeito nota 10”
Empresa União Brasileira de Divulgação (UBD), de Pernambuco, vendeu diploma a um jumento, o “Precioso”, de Paulista (PE) Giovani Grizotti / Agencia RBS
O comércio de diplomas de mérito para
vereadores, prefeitos e secretários municipais será investigado pelo Ministério
Público (MP) do Rio Grande do Sul após o Fantástico, da TV Globo, denunciar
neste domingo (5) que políticos usam recursos públicos, por meio de diárias,
para receber premiações. Para demonstrar a falta de critérios na concessão
desse tipo de reconhecimento, a reportagem incluiu um jumento entre os
“prefeitos nota 10 do Brasil”.
As empresas alegam realizar consulta
telefônica ou analisar indicadores sociais municipais antes de selecionar os
agraciados. Só que essas avaliações, muitas vezes, não ocorrem. Em seguida,
políticos são procurados pelos institutos, que oferecem a condecoração em troca
de valores. Alguns não aceitam participar.
Em Terra de Areia, no Litoral Norte,
o Instituto Tiradentes apontou Pedro Henrique Gross (MDB), chefe de gabinete do
prefeito, como segundo vereador mais atuante do município. O instituto diz ter
feito pesquisa em outubro de 2017, cinco meses após Gross ter se licenciado do
mandato.
— Fiquei confuso porque não estava na
Câmara como vereador, né? — relata o político, que decidiu não receber o
prêmio, pelo qual teria de pagar R$ 578.
Em Paulo
Afonso, políticos como Luiz de Deus, Marconi Daniel, Marcondes Francisco,
Petrônio Nogueira e Leda Chaves já foram premiados pelo instituto investigado.
Veja:
Dados do Tribunal de Contas do Estado
(TCE) mostram que, em três premiações realizadas em Porto Alegre em 2016 e
2017, o instituto faturou R$ 116 mil em quase uma centena de Câmaras e
prefeituras.
— A empresa, pelo que vimos, atribui
o prêmio em decorrência de pesquisa telefônica feita com eleitores. E que não é
comprovada, o que revela fraude — diz Valtuir Nunes, porta-voz do TCE.
Promoção pessoal e lucro para
empresas
Para o chefe do MP, Fabiano Dallazen,
“esses eventos visam à promoção pessoal do agente público e ao lucro das
empresas”. O especialista em gestão pública, Aloísio Zimmer, diz que o mais
preocupante são as notícias falsas geradas como repercussão das premiações,
especialmente em blogs e redes sociais, o que pode, inclusive, influenciar
eleições:
— Cria-se até mesmo uma implantação
de falsas memórias no cidadão que depois será eleitor, porque o prefeito passa
uma imagem de bom gestor.
Administração de jumento foi
considerada “nota 10”
A empresa União Brasileira de Divulgação
(UBD), de Pernambuco, também usa o pretexto de organizar seminários para
oferecer premiações a políticos. Para demonstrar a falta de critérios na
concessão dos títulos de “gestor nota 10”, a equipe negociou a compra de
diploma e medalha a um jumento, o Precioso, de Paulista (PE). O custo da
honraria foi de R$ 1.480.
O repórter se fez passar por assessor
de três prefeituras gaúchas. Inicialmente, adquiriu dois certificados para
prefeitos reais, que autorizaram o uso de seus nomes para desvendar a farsa.
Na cerimônia de entrega da premiação
em Brasília, verificou-se que o seminário se resumia à entrega das homenagens.
A equipe do Fantástico conseguiu
incluir o jumento Precioso na lista dos supostos cem melhores prefeitos do país
ao negociar com o diretor da UBD, Fernando Vieira da Cunha.
A compra da honraria foi feita por
meio de troca de mensagens.
Precioso, então, foi convidado
a receber a medalha de mérito e o diploma Gestor Nota 10 em outro encontro,
desta vez em um hotel de Recife (PE). Ele teria sido aprovado em saúde,
infraestrutura, educação, assistência social e transparência pública. Convidado
pelo repórter a entregar o diploma no lado de fora do hotel, Cunha deparou com
o jumento. Questionado se sentia vergonha em conceder um diploma ao animal,
disse:
— Não, porque esse aqui carregou
Jesus Cristo, ou não?
Contraponto
O que diz o Instituto
Tiradentes
Por meio de nota, o instituto informa
que não comercializa medalhas e diplomas de mérito, nem certificados de
participação em seus seminários, que são emitidos, apenas, àqueles
participantes presentes em pelo menos 75% dos seminários.